AS OPALAS LARANJAS DE BURITI DOS MONTES

No Estado do Piauí, os municípios de Pedro II e Buriti dos Montes têm as ocorrências opalas mais importantes do país. As qualidades gemológicas dessas opalas são equivalentes às famosas opalas australianas. As opalas laranjas do Buriti dos Montes não exercem o mesmo fascínio que as preciosas opalas de Pedro II porque não mostram um jogo de cores. No entanto, essa variedade tem sido muito apreciada devido a outras características, que também são adequadas para uso em joias, como suas tonalidades laranja, transparência, dureza e estabilidade relativamente alta. O conteúdo exótico de inclusões sólidas proporciona maior beleza às opalas laranjas encontradas nesta região. Essas inclusões ocorrem isoladas ou em vários arranjos com tamanho milimétrico a centimétrico que são intrínsecos aos opalas do Buriti dos Montes. Opalas piauienses originadas de processos hidrotérmicos. Nesse contexto, o artigo discute a morfologia, a composição mineralógica e química das inclusões sólidas, sua interação com as opalas laranjas e sua significância genética.
As opalas piauienses estão hospedadas nas rochas sedimentares da Bacia Paleozoica do Parnaíba, que envolve três ciclos de deposição controlados pela tectônica global. As formações Jurássica (Pastos Bons, Corda, Sardinha e Mosquitos) e Cretáceo (Formações Grajaú, Codó e Itapecuru, no norte, e Grupo Areado e Formação Urucuia, no sul) foram consideradas parte desta bacia, mas estão diretamente relacionadas com o rompimento de Gondwana; portanto, suas evoluções são distintas da Bacia do Parnaíba. O Grupo Serra Grande ocorre dentro dos limites da Bacia do Parnaíba e se apresenta em discordância com o Grupo Canindé. Representando primeira deposição marinho na Bacia do Parnaíba, correspondendo a um ciclo transgressivo-regressivo completo, onde sedimentos fluviais-deltaicos a rasos marinhos foram depositados e consolidados em Formações Ipu, Tianguá e Jaicós. Em geral, arenitos continentais e conglomerados com possível influência glacial (Formação Ipu) estão presentes em contatos graduais com arenitos e xistos marinhos (Formação Tianguá) que são sobrepostos por arenitos e conglomerados fluviais (Formação Jaicós).
O magmatismo básico cretáceo ocorre na forma de peitoris e diques que constituem a Formação Sardinha e cortam a Bacia do Parnaíba, incluindo sua base, onde são encontradas as rochas do Grupo Serra Grande que abrigam as opalas estudadas. Essas opalas laranjas são encontradas principalmente como veias e veias, preenchendo as fraturas nos arenitos do Grupo Serra Grande. Eles também ocorrem na cimentação de breccias na zona de contato entre rochas hospedeiras e diques mafic. Esses depósitos primários formaram a fonte para os depósitos de colúvio e paleochannel. Localmente, há veias de quartzo associadas a opalas com goethita dispersas entre cristais de quartzo e opalas.
Materiais e Métodos
Foram utilizadas cento e quarenta e seis amostras opalas distribuídas em 20 lotes, com uma média de aproximadamente 7 peças cada. Essas amostras foram coletadas pelo geólogo Érico Rodrigues Gomes. As opalas e suas inclusões foram caracterizados por suas composições de morfologia, micromorfologia e mineralógicas e químicas utilizando as seguintes técnicas analíticas:
Estereomicroscopia óptica: Todas as amostras foram observadas com um estereómico Zeiss (modelo Stemi 2000-C), descrito de acordo com suas características macroscópicas e fotografado.
Difração de Pó de Raio-X (XRD): O XRD foi realizado no Laboratório de Caracterização Mineral do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Pará (IG-UFPA). O XRD foi utilizado para determinar as principais fases minerais e o grau cristalino de ordem-desordem (cristalino) das opalas, que foram preparados pelo método de pó. Utilizamos um ditractômetro de raios-X (modelo X'Pert Pro MPD (PW 3040/60) PANalítico) com um goniômetro PW3050/60 (φ-φ) e uma cerâmica de tubo de raios-X com um ânodo (Kα1 = 1,540598 Å) modelo PW3373/00, longo e fino foco, filtro Ni Kβ, detector de varredura múltipla em tempo real X'Celerator (RTMS) no modo de digitalização com um comprimento ativo de 2.122º. Foram realizadas varreduras de 5° a 75° 2φ com tensão de 40 kV, corrente de 30 mA, passo de 0,02° em 2φ e 10 s/passo, fenda automática e 4° anti-dispersão, uma máscara de 10 mm e um movimento giratório de amostra com 1 rps. Os dados foram processados e interpretados usando um X'Pert Data Collector e um software X'Pert High Score, ambos da PANalytical.
Espectrometria de massa de plasma acoplado indutivamente (ICP-MS): O ICP-MS foi realizado na Acme Analytical Laboratories Ltd. para determinar a composição química a granel dos opalas.
As amostras foram previamente pulverizadas em alíquotas de 200 mgs, derretidas com metaborato de lítio e tetraborato, e depois dissolvidas com ácido nítrico.
Os principais elementos C, S e trace, incluindo elementos de terras raras (REE), foram determinados.
A perda na ignição (LOI) é dada pela diferença de peso após a calcinação a 1000°C.
Microscopia eletrônica de varredura (SEM/EDS/CL): Fragmentos e seções finas polidas de opalas, enfatizando suas inclusões, foram utilizados para o estudo morfológico e mineralógico utilizando imagens de elétrons secundários (SE) e análise química semi-quantitativa de elétrons dispersivos de energia (EDS). Todos os fragmentos de amostras foram fixados em stubs com fita de carbono de dupla face e revestidos com ouro por 2 minutos. As seções finas polidas também foram utilizadas para obter imagens de backscattered (BSE) e cathodoluminescence (CL), além da análise de EDS. Estas seções finas foram revestidas com ouro por 2 minutos para análise de EDS e 30 segundos para imagens CL, com espessura de revestimento de 15 nm e 3 nm, respectivamente. Foram utilizados um LEO ZEISS SEM (modelo 1430) com detector EDS Sirius-Gresham e um Mono-CL Gatan pertencente ao Laboratório de Microscopia eletrônica de varredura da UFPA.
As condições de operação das imagens SE e BSE e a análise da EDS foram as seguintes: corrente de feixe = 90 μa, tensão acelerada = 20 kV, distância de trabalho = 15 mm, tempo de varredura = 30 s com 3000 a 4000 ciclos por segundo (c/s) para cada análise. As condições para as imagens CL eram as mesmas, mas com distância de trabalho = 13 mm.
Estrutura Opala
As opalas do Buriti dos Montes são semitransparentes à translúcida e possuem uma ampla gama de tons, do amarelo claro ao vermelho acastanhado. Nas imagens da SEM, é possível ver que os interstícios entre as esferas de sílica que formam o opala foram parcialmente preenchidos por cimento opala, mascarando o aspecto subesférmulo típico, dando origem a uma característica quase massiva. Os diâmetros da esfera variam de 150 a 500 nm. Esferas irregulares e arranjos compactos não permitem a produção de um jogo de cores, efeito que se manifesta somente quando as esferas são perfeitas, uniformes de tamanho e possuem uma embalagem regular sem qualquer preenchimento de interstícios. No entanto, esses opalas têm boa transparência, o que pode estar relacionado ao tamanho dos espaços entre as esferas, pequenos interstícios proporcionam maior transparência aos opalas.
Morfologia de Inclusões Sólidas
Os diferentes tipos de inclusões sólidas nas opalas estudadas foram identificados e classificados de acordo com a morfologia utilizando critérios como forma, cor, tamanho e textura, bem como o arranjo tridimensional produzido dentro das opalas.
As inclusões, denominadas bolhas, correspondem a cavidades arredondadas com diâmetros entre 5 e 20 mm e são brancas de creme ou acasturas de acordo com o recheio, geralmente de arenitos hospedeiros. Algumas bolhas têm um filme branco na parede interna da cavidade, enquanto outras estão completamente vazias, o que provavelmente indica conteúdo de gás já lançado. Há bolhas cercadas por fraturas de tensão com aparência externa de microconcreções e preenchidas com sílica opalina. As inclusões botryoidais são agregados arenosos da rocha hospedeira, com um aspecto botryoidal e uma tendência geral para o arredondamento. Sua cor varia de branco para creme e tons marrons a tons avermelhados. O arranjo espacial dessas inclusões dentro das opalas permite caracterizar diferentes morfologias, como recifes de corais, estalactites, estalagmites e colunas. As inclusões dendríticas, com um aspecto arborescente típico, são escuras, geralmente marrons, e estão associadas a inclusões botryoidais, bolhas e fraturas.
Opalas do Buriti dos Montes com as principais inclusões sólidas e características associadas. A - bolha com fratura de tensão, B - bolha opala branca com sarampo fe no centro, C - inclusão botryoidal-colunaar com fraturas de tensão, D - dendritos, E - inclusões lamelar com terminações botryoidais, F - inclusões helicííticas com fraturas secas, G - fraturas seladas em opala vermelha, H - mancha vermelha em opala laranja.
As inclusões tabulares ou lamelares são grupos de lamellae paralela ou plaquetas de material arenoso. Os microcristais, isolados ou agrupados, são euedral e bem formados. Microcristais de inclusões de quartzo nessas opalas são frequentes. Nódulos, compostos de materiais das rochas hospedeiras, representam fragmentos arenosos que não foram completamente dissolvidos durante a migração de fluidos hidrotérmicos. As inclusões helicíticas ou teias de aranha são formadas por agulhas minúsculas marrons e irregulares, semelhantes aos fios de cabelo, constituindo juntos um arranjo semelhante a uma teia de aranha. Os tubos são canais cilíndricos e alongados, às vezes curvados, com diâmetro milimétrico, que podem estar vazios ou parcialmente ou completamente cheios de material arenoso. O recheio dá cores avermelhadas ou esbranquiçadas aos tubos.
Algumas características, como estruturas de fluxo (estrias que representam a provável migração de fluidos através de arenito de hospedeiro fraturado) e fraturas, ocorrem isoladamente ou em associação com inclusões botryoidais e bolhas. Há fraturas seladas, fraturas secas (fraturas não preenchidas), fraturas de tensão (fraturas semicirculares que circundam outras inclusões), fraturas superficiais (fraturas externas, não penetrantes) e fraturas de rachaduras (grupo de fraturas interconectadas que delimitam pequenos polígonos com caráter penetrante). Patches e zonas de cor, também frequentes, são porções de opala com variações da cor principal.
Caracterização Mineralógica
A análise mineralógica por XRD revelou diferentes graus de ordem-desordem em opalas laranjas, de opalas amorfas (opala-A) a opalas cristobalita-tridímita (opala-TC). Amostras GB 7-28, GB 8-37 e GB 6-2 são típicas do opala-A, cujos padrões de difração mostram um pico principal com d = 4,11 Å (4,10/4,12), fundo largo e alto, e outro incipiente em d = 2,50/2,51 Å. O alto fundo e a baixa resolução do pico d = 4,32 Å, às vezes quase imperceptível, sugerem cristalina de baixa ordem, aproximando-se de um estado amorfo. As amostras GB 2-14 e GB 9-6 são tipicamente opala-CT, caracterizadas por distâncias interplanas d = 4,10 Å (4,11), 4,31 Å (4,32/4,33), 2,50 Å, 2,05 Å e 1,63 Å. Entre os termos definidos como amorfo e cristobalita-tridímite, há estágios intermediários de ordem-desordem cristalina, como no GB 1-24, GB 5-5, GB 4-5, GB 3-20 e GB 10(Figura 3A, B). A presença de kaolinita nas inclusões sólidas é indicada por reflexos d = 7,17 Å (7,18/7,19) e 3,58 Å. Os espaçamentos interplanos d = 3,34 Å (3,35), 1,54 Å e 1,44 Å referem-se a inclusões microcristais de quartzo nas opalas. Estes microcristais de quartzo, bem como inclusões botryoidais e lamelar, nódulos e tubos formados predominantemente por kaolinita foram confirmados pela análise da EDS.
Além desses minerais, hematita e/ou goethita também foram encontradas nas porções mais escuras das inclusões botryoidais, dendríticas e helicíticas, bem como nos nódulos e no centro de uma bolha formada por opala branca dentro do opala amarelo. Pseudomorfos opalinas de gesso ou barita foram encontradoslocalmente, preenchendo pequenas cavidades em opalas. A análise da EDS indicou apenas Si e O, mostrando que essas inclusões foram completamente substituídas pela sílica opalina, preservando, no entanto, a forma dos cristais. O quartzo hialino também ocorre em pequenas drusos e veias que acompanham opala. Quando retratados por CL usando SEM, esses cristais revelam um padrão de zoneamento concêntrico perpendicular ao eixo c, mostrando várias intensidades de luminescência. Esta característica é o diagnóstico de origem hidrotérmica e contrasta fortemente com a textura extremamente homogênea, ou seja, sem zoneamento, exibida por grãos de quartzo detrital dos arenitos que abrigam a mineralização. Nas imagens cl, foram observadas venules de quartzo hidrotérmico sobreocrescido, indicando que os fluidos migraram através dos interstícios dos grãos para os arenitos. A espessura das veias hidrotérmicas de quartzo aumenta gradualmente em direção às veias do minério, até que os grãos detrital sejam completamente consumidos, deixando cristais de quartzo euedral neoformados.
Composição química
As opalas do Buriti dos Montes são compostas principalmente de SiO2 (90,14 % em média) e 8,03 % de água (à base de LOI), 1,32 % Al2O3 e 0,2 % Fe2O3. Osconteúdos do SiO2 correlacionam-se negativamente com Al2O3 e Fe2O3,provavelmente devido às inclusões minerais, como kaolinita e hematita. Parte do conteúdo de sílica também é encontrada como inclusões de quartzo. Al também pode ser um potencial substituto si nas estruturas opalas. Entre os elementos de rastreamento analisados, destacam-se apenas os altos valores da Ba, variando entre 195 e 1373 partes por milhão (ppm), com média de 808 ppm. Outros conteúdos de elementos de rastreamento estão muito próximos dos limites de detecção. Gomes (2002) enfatiza que as veias baritais são comuns nos arenitos que hospedam opalas. A amostra GB 4, que é mais rica em Al2O3 e Fe2O3,exibe os maiores conteúdos de REEs (Figura6B) e elementos de traço, provavelmente devido a uma associação com as inclusões sólidas de hematita e kaolinita. A partir da análise da EDS, foi possível identificar conteúdos mais elevados de Fe em manchas e zonas de cor escura do que na matriz opala. Da mesma forma, as bordas de reação em torno de inclusões helímáticas e dendríticas têm maior teor de Fe, com uma média de 4500 ppm em comparação com o opala circundante com uma média de 1700 ppm de Fe.
Conclusão
O vasto conteúdo de inclusões sólidas, seus arranjos, relações de contato, mineração e composição química reforçam a gênese hidrotérmica das opalas laranjas do Buriti dos Montes. A maioria das inclusões são formadas por materiais das rochas hospedeiras ou simplesmente de partículas que foram envolvidas por fluidos durante sua migração através das fraturas nesses arenitos. O fluxo de fluidos hidrotérmicos é evidente nas estruturas de fluxo presentes nas opalas e em características que representam a dissolução parcial de algumas inclusões (por exemplo, a reação beira as inclusões helicíticas e dendríticas). Outras características, como fraturas seladas, manchas e zoneamento de cores, referem-se ao fluxo de fluidos tardios e à dissolução parcial de partículas de plasma hematitica. O zoneamento de cores foi criado pela neoformação de sarampo fe, como hematita e goethita dentro das opalas.
A possível existência de micro e nano-inclusões, ricas nesses minerais, também pode contribuir para esse efeito. As inclusões lamelares revelam uma estrutura que pode se originar da deformação de arenitos assimilados por fluidos, considerando que a área mineralizada está sob a influência do Lineament Transbrasiliano. As opalas de Buriti dos Montes são marcadas pelo alto conteúdo de Ba e Fe. A BA pode possivelmente constituir inclusões de barita, um mineral comum em rochas da região. Fe ocorre como oxi-hidróxidos em inclusões sólidas, que dão a cor laranja distinta a essas opalas. A presença de barita, hematita e kaolinita também reforça o contexto de um ambiente hidrotérmico para a origem dessas opalas. Esta gênese hidrotérmica também é confirmada pela presença de quartzo hialina com zoneamento intenso em CL, em contato lateral com opala nas veias, e como microcristais incluídos nas opalas. Essa hipótese é corroborada pela morfologia das inclusões, pelo conjunto mineral caracterizado por hematita, barita e kaolinita, e pela ocorrência simultânea de inclusões e veias de quartzo tipicamente hidrotérmico.
Esse ambiente hidrotérmico provavelmente foi condicionado pelas bases diabases da Formação Sardinha, que atuou como fonte de calor responsável pelo aquecimento das soluções aquosas presentes nos arenitos do Grupo Serra Grande. Esses arenitos também contribuíram para a maior parte da sílica solubilizada necessária para a saturação da solução, enquanto as extensas e numerosas fraturas eram indispensáveis para a captura dessas soluções hidrotérmicas, hospedando assim as veias mineralizadas.
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